Indústria de defesa: Brasil busca alternativas aos EUA nos Emirados Árabes Em entrevista à CNN, o CEO do Grupo Edge, Hamad Al Marar, comentou as novas oportunidades de investimentos, o orçamento de defesa e o papel do Brasil como hub regional

Global News Space 08/09/2025 15:30

Com as tensões nas relações diplomáticas entre Brasil e Estados Unidos, autoridades brasileiras têm buscado diversificar os parceiros comerciais. Na indústria de defesa, esse cenário não é diferente, e os Emirados Árabes Unidos já despontam como o candidato favorito.

A estratégia não é substituir completamente a indústria de defesa dos EUA, algo considerado impossível pelos militares brasileiros, mas sim ampliar o leque de parceiros para reduzir a dependência de produtos americanos.

O ambiente de investimentos no setor de defesa no Brasil, no entanto, é considerado complexo.

Ministério da Defesa e as Forças Armadas vivem uma realidade orçamentária aquém do necessário, na avaliação de militares, além da baixa previsibilidade de recursos.

Isso acaba afastando potenciais investidores e inibindo a modernização. No setor privado, os empresários convivem com um ambiente tributário considerado complexo.

Isso, porém, não parece ser um grande problema para os Emirados Árabes Unidos.

O Grupo Edge, um dos maiores conglomerados de defesa do mundo, em menos de três anos de atuação no Brasil já comprou duas empresas nacionais, fechou uma parceria para desenvolver mísseis com a Marinha, construiu uma fábrica no país e firmou acordos na área de segurança pública com governos estaduais.

A companhia, sediada em Abu Dhabi, já investiu cerca de R$ 3 bilhões no Brasil.

Em um momento em que o país procura novos parceiros, é mais fácil para o governo estreitar relações onde os vínculos já estão consolidados. O próprio Grupo Edge concorda com essa visão.

Em entrevista à CNN, o CEO do Grupo Edge, Hamad Al Marar, afirmou que o distanciamento entre Brasil e EUA pode ser uma oportunidade para a empresa ampliar a atuação no país.

“100% (pode ser uma oportunidade). Quando olhamos para nossa linha de atuação, tudo se resume, no caso da defesa, à posição política, em determinado momento e em determinada circunstância. As relações — em qualquer lugar, até mesmo entre famílias — sobem e descem.”

“As oportunidades existem, e temos atuado de forma genuína, com as especificações corretas, a proposta certa, o cronograma de entrega adequado e o preço justo. Portanto, olhando por esse lado, o mercado está aberto. Agora, quando há tarifas aplicadas, geralmente conseguimos estar em uma posição melhor e mais competitiva”, disse o CEO.

Representantes da empresa estiveram no Brasil na última semana e tiveram reuniões com as Forças Armadas e com o vice-presidente da República, Geraldo Alckmin.

Hamad, ao comentar a visita – que também marcou a inauguração da nova sede da Siatt, empresa brasileira comprada pelo grupo –, afirmou que a proximidade entre autoridades brasileiras e emiratis já é algo além de uma simples abordagem comercial.

“De forma geral, claro, viemos com uma abordagem de negócios, mas acredito que hoje já estamos muito além disso. A parte brasileira está bastante familiarizada conosco. Temos atuado de forma muito ativa em várias frentes, encontrando diferentes stakeholders e tomadores de decisão. A credibilidade se prova com o tempo, e acredito que estamos na trajetória certa para isso”, disse.

A falta de orçamento no Brasil também foi pauta na entrevista. Na avaliação do Grupo Edge, isso não é um entrave no momento. Hamad cita que a estratégia de negócios do conglomerado é investir em projetos nacionais que já tenham certo grau de desenvolvimento.

“Sempre é positivo ter mais de um parceiro conduzindo esse tipo de desenvolvimento: reduz custos, pode ampliar o acesso a capacidades que ajudam a entregar mais rápido e, no fim das contas, pode até gerar dois clientes em vez de apenas um”, disse.

Hamad também afirmou que as parcerias não devem ficar restritas apenas ao setor de defesa.

“O Grupo Edge é uma empresa única, porque atua em várias frentes: defesa, cibernética, segurança nacional, satélites e espaço. Ou seja, não se trata apenas do orçamento militar, mas de qualquer projeto que envolva o elemento da segurança”, concluiu.

O CEO também destacou a mão de obra brasileira, especialmente os engenheiros, considerados altamente qualificados. Ele reforçou ainda o papel estratégico do Brasil na América Latina, que pode servir como uma espécie de showcase de sucesso para a expansão do grupo na região.

“E quando falamos sobre o Brasil, não podemos esquecer que ele está inserido na América Latina, que representa um grande mercado — inclusive além das fronteiras”, afirmou.

A empresa planeja, inclusive, expandir os negócios na América do Sul.

Investimentos no Brasil

O Grupo Edge, empresa que tem sede em Abu Dhabi, já investiu cerca de R$ 3 bilhões no Brasil.

Em setembro de 2023, o conglomerado anunciou a aquisição de 50% da brasileira SIATT, empresa especializada em armas inteligentes e sistemas de alta tecnologia.

Além de parcerias na área de segurança pública com o estado de São Paulo, em 2024 o grupo adquiriu 51% da empresa brasileira Condor Tecnologias Não Letais, uma das principais produtoras mundiais de gás lacrimogêneo, munição de borracha, granadas de fumaça e produtos relacionados.

Em 2025, a SIATT e a Marinha do Brasil assinaram um acordo para a produção e desenvolvimento conjunto de mísseis no Brasil.

O acordo é um contrato de compartilhamento de propriedade intelectual que define os termos e condições para o desenvolvimento e a produção do MANSUP (Míssil Antinavio Nacional) e de sua versão de longo alcance, o MANSUP-ER.

O documento prevê direitos para modificações, uso, produção e exploração comercial tanto no Brasil quanto em outros países, com o pagamento de royalties de retorno à Marinha. Ou seja, os mísseis poderão ser utilizados tanto pelas Forças Armadas brasileiras quanto exportados, fortalecendo a indústria nacional de defesa.